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quinta-feira, 24 de junho de 2010

O INÍCIO

Pode uma história de dor e de saudade reverter-se em benção e esperança? Como pode alguém tão jovem, morrer tão dramaticamente e deixar um legado de vida? A Dani nunca pensou em deixar uma história. Ela simplesmente viveu sua vida.Nós, os que ficamos, estamos interpretando a história através de tudo aquilo que passamos.

Claro que a saudade é enorme. Principalmente no semblante dos pais - Sylvio e Ana Maria - Porém, a certeza da ressurreição é eminente em nossa vida por intermédio da Fé.

A ausência da Fé mata mais que a leucemia que a Dani teve. Pais que não tem fé morrem antes de seus doentes filhos.

Que este despretensioso blog sirva de partilha sobre vida acima da morte. Mesmo sem entender, nós que ficamos, esperamos pela graça do reencontro. Não mais neste corpo corruptível e amargo mas, no corpo plenificado pela presença real do Senhor.

Unimos nossa a dor a dor de tantas pais, mães, irmãos, avós, tios que também "vivem suas vidas" pensando na pessoa que já se foi.

Um quarto, um rádio, um poster, uma sandalínha, um cachorro de pelúcia, um velotrol, uma camisa, um perfume, um caderno com meio uso... Uma canção, um violão, uma almofadinha e um relógio. Porque será que só após a morte conseguimos interpretar a comunicação do amor?

Deus abençõe você. Que a "boa saudade" ocupe sua mente e seus olhares.
Deus está conosco.

"Com Deus até o fim, mesmo sem entender."

EU TIVE UMA MENINA...

Eu tive uma menina em minha vida. Talvez das mais lindas que já conheci. Boa filha. Linda namorada. Atleta. Corpo bonito e cabelos anelados.

Durante um jogo de vôlei, ela caiu e bateu o joelho no chão. Nada diferente de uma dor comum em uma atleta. Mas, aquela dor começou a se espalhar pelo corpo todo.

Aos poucos, a garota foi tomada de dores em todos os cantinhos do esqueleto. Algo que nunca tínhamos visto. Em poucos dias, as dores do joelho tomaram o corpo todo e, a menina já nem conseguia mais andar direiro. Eu era bem ligado à família e pude conviver com este sofrimento.

Difícil foi achar um motivo para essas dores. Um dia, em São Paulo, na escola paulista de medicina, o Dr. Goldenberg deu dois diagnósticos: esclerose múltipla ou leucemia. Confimado: leucemia. Sendo assim, a família começou o tratamento de quimioterapia e de radioterapia.

Aos poucos, a bela menina de corpo bonito e cabelos anelados, foi se tornando quase um cadáver ambulante. Seus cabelos caíram. Seu sorriso estava mofado e seus olhos já não brilhavam com tanta originalidade.

A leucemia foi avançando e a menina foi se cansando. Cansou tanto que no dia 1º de janeiro de 1993 ela parou de andar. Estava paralítica.

Suas mãos, que antes davam saques bem altos e cortadas de vôlei, agora estavam pesadas demais até para levantar a flor que eu levei para ela, em uma certa noite.

Eu vi um ser humano minguar. Nunca tinha visto aquilo. Era um trauma. As cenas mais chocantes eu presenciei. Ela chorava de dor de tanta quimioterapia no corpo. E a morfina tinha o mesmo efeito de um AAS.

A incansável leucemia foi se concretizando no corpinho que agora pesava no máximo 25 kilos. A pele escureceu e ficou queimada de tanta química. Os dentes foram se amarelando e o corpo perdia suas curvas naturais.

A leucemia virou um tumor. E outro. E mais outro. Quando demos conta seu corpo era um depósito de tumores. Muitos se espalhavam por todo o seu organismo. Só na cabeça estouraram três dos grandes. Ela estava deformada. Esquisita. Apagada.

O câncer não cansou e foi se alastrando para os pés e mãos. Em pouco tempo pegou sua coluna. A menina estava tetraplégica.

Um ano antes era uma atleta de vida longa. Hoje, um ser totalmente dependente até para tomar banho, cortar as unhas e fazer xixi.

Dia 18 de março de 1993, às 15 horas (hora da Misericórdia Divina) a menina - e seu nome era Daniele - dava seu último suspiro nesse mundo, soltava uma lágrima que lhe escorreu pelo peito já sem seios, sorria e se despedia de nós.

O último sorriso ficou gravado em seus lábios durante as 26 horas de velório.

Eu tive esta menina como irmã por 14 anos. Os pais que eu vi sofrer eram também os meus pais. A mãe que rezava a noite, descontrolada era minha mãe. O pai que vi envelhecer vendo o sofrimento da filha era o meu pai.

Algumas pessoas dizem que eu sou forte. Outras dizem que eu sou especial. Acredita mesmo nisso? Eu não. Quem segurou minha fidelidade e meu chamado foi Deus.

O sofrimento aconteceu e eu não relatei dez por cento dele aqui.

Hoje, quando penso na Dani, minha saudosa irmã, duas coisas me vem à lembrança: o tercinho de Nossa Senhora que ela não largava e o sorriso dela quando eu fazia palhaçada.

Se para ficar comigo Deus não me poupa dos sofrimentos, é assim que será. Deus encontra Seus melhores amigos no sofrimento e não na festa.

Algo vem em meu coração quando me lembro de tanto sofrimento: "Filho, é tão lindo ver-te sofrendo e não Me abandonando que a cada dia Me apaixono mais e mais por ti. Obrigado".

Deus está comigo. Não tenho dúvidas disso.

ME ESPERA - Música


LETRA DA MÚSICA "ME ESPERA"
Autor: Silvinho Zabisky
Gravada no CD Calmaria, 1998.
(coloquial popular)
- ouça na Rádio Beatitudes: www.radiobeatitudes.com -

Pelas vezes que a gente brincou
E chorando de rir divertiu
Pelas vezes que a brincadeira
A sala de casa alegrou

Pelas vezes que a gente brigou
E de mal por dois dias ficamos
Pelas vezes que nós apanhamos por causa
Nem me lembro mais

Pelas vezes que fomos herói um do outro
E choramos nossas despedidas
Me espera... me espera

Pela vez que o teu pé decidiu
Nenhum passo neste mundo mais dar
Pela vez que a tua coroa caiu

Pelas vezes que os furos te entraram
E as estradas nos distanciou
Pela última lágrima seca que rolou

Pela vez que no teu sofrimento eu arranquei
Um sorriso aguado de você
Me espera... me espera

Me espera
Me espera aí no céu,me espera
"tá" faltando eu carregar um pouco mais de curz
Pra poder chegaraí até aonde você "tá"...

Espera
Espera eu combater meu bom combate
Espera
Espera eu encerrar minha carreira
Espera
Espera a hora certa pra eu guardar a minha fé

Enquanto isso eu vou cantando
E tocando violão.
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Explicação da música:

"Pela vez que o teu pé decidiu"
foi quando a Dani ficou tetraplégica

"Pelas vezes que os furos te entraram:
devido ao alto número de picadas de injeções.

"Pela vez que a tua coroa caiu"
Quando a Dani ficou sem cabelo devido a aplicação de quimoterapia.

"Lágrima seca".
Foi a última lágrima derramada pela Dani. O autor interpretou como última lágrima. Daí para frente nunca mais estes olhos chorariam.

"cantando e tocando violão".
O autor fazia isso constantemente perto da cama da Dani. Durante o velório e no enterro ele tocou violão ecantou para a irmã. E fez esta promessa: até o dia de nosso reencontro vou cantando e tocando violão.

Baixe a música para você escutar